sexta-feira, 24 de abril de 2009

Na luta pela sobrevivência à qualquer preço, a maior vítima é o belo.



Recebi um e-mail com a reprodução “ficha” policial dos tempos da ditadura militar, da ministra Dilma Rousseff, sem nenhuma explicação maior, somente o fac simile e a palavra “companheira” seguida de uma interrogação (?). Apesar de minha letargia política dos últimos anos, estou em uma fase de digestão ideológica, entre a preguiça matuta e o desejo de ver “o circo pegar fogo”; respondi o e-mail como faço com todos os textos “maravilhosos” de advento ou amor de deus, que cristãos inadvertidos costumam me mandar. Em meu e-mail disse do orgulho que sentia daquela pessoa retratada na ficha policial, do fato de que alguns se acomodaram a realidade nova e outros lutaram contra a ditadura. Falei de uns boletins de ocorrência contra mim que tenho guardados , quem sabe um dia não me torne uma pessoa alvejada pela mídia, embora não tenha a pretensão de assumir qualquer cargo político, o último que verguei foi o de morumbixaba da Taba de Corumbê, ao qual renunciei à primeira contestação de minha “autoridade”. É claro que fiz o que queria, já estava farto de ser o “responsável”.

A resposta do missivista cibernáltico, foi: Será? De que adiantou tanta “valentia”. Ao que respondi: É. Tenho orgulho sim. Não duvide de meu orgulho, é meu e de mais ninguém. Sei que é uma coisa besta, nós fomos derrotados e a ditadura caiu de podre, mas nunca duvidem de nossa fé em que fazíamos, depois morreu, esmoreceu, como tudo através do tempo fica fraco e incômodo, mas acho que só o Gabeira mesmo ficou com vergonha do que fez (vergonha com dividendo políticos e midiáticos). Nem sei a quantas anda a política de Brasília, o Brasil vive em seus dois séculos de existência, pois surgiu oficialmente em 1808, sempre o mais do mesmo. A democracia representativa baseada na opinião pública, forjada pelos meios de comunicação de massa que estão nas mãos das grandes corporações, me enoja. Este cinismo sem limite que virou nosso país, me deixa com muito pouca vontade de militar politicamente, o pior é que nem tenho mais minha barba para por de molho. Branqueou de um jeito, que meu visual revolucionário se esmoreceu, minha pessoa ia parecer Papai Noel ao invés de Chê Guevara: barba branca e barriga saliente. O Chê é que foi feliz, nunca vai ficar velho, nunca vai passar por crises de autocrítica, nem vai precisar tomar remédio para a pressão de doze em doze horas.

O pessoal para garantir a eleição do “Zé Serra”, que lamentavelmente já está quase dada, está passando dos limites, acredito que deveríamos ter uma postura republicana e de urbanidade diante da feitura da política. O falecido Serjão deixou suas marcas na política brasileira, e infelizmente tem muito “companheiro” também adotando suas práticas. Já dizia Ghandi, olho por olho e a humanidade toda ficará cega. Cinismo por cinismo, e ninguém mais vai acreditar em ninguém em nossa “amada” Pindorama. Houve uma lei de Anistia em nosso país, pelo bem ou pelo mal, não existe crime algum em ter sido terrorista. Palavra que hoje tem uma conotação diferente daquela época. Depois do onze de setembro americano, um título que carregávamos jovens com orgulho, hoje é uma palavra feia. É certo que o onze de setembro chileno a imprensa mundial esqueceu logo, será que é por que os “terroristas” neste caso foram os americanos? Imagino que se houvesse fichamento policial no Império Romano, teríamos a ficha criminal de Jesus Cristo, além de uma relíquia sagrada que seria a prova definitiva de sua existência, também apareceriam as palavras: agitador, terrorista, criador de caso, inimigo do Império. É muito complicado hoje, com nosso conforto todo, pensar naqueles tempos. Em relação aos boletins de ocorrência contra mim, que tenho guardado, quem sabe um dia viro história também. Embora não pretenda ser candidato a nada. Ao meu amigo virtual deixo as palavras de Gianfrancesco Guanieri, "...valentia, posso ensinar..." “mas liberdade só posso esperar...”

E o que esta arenga toda tem a haver com poesia? Bem o poeta e amigo Cláudio Willer, diz que toda a poesia é uma transgressão política, é um ato de rebelião. A poesia é desbocada, é aquela pessoa que nos mata de vergonha nas festas a nos jogar nossas indiscrições na cara.

Quantos poetas não foram presos e processados: Baudelaire teve que censurar suas Flores do Mal, Rimbaud foi processado por sua opção sexual, ou seu amor adolescente por Verlaine. Oscar Wilde se tornou persona nom grata na Inglaterra vitoriana. E minha infeliz memória não me permite mais e mais exemplos, que encheriam a crônica. Hoje não somos mais presos, Hakim Bey já nos afirma tão inúteis, que nem perigo para a sociedade não somos mais, o terrorismo que ele nos conclama é o terrorismo poético. Nem sei se em face ao cinismo que abunda no mundo, qualquer terrorismo realmente faça efeito, quer com homens bomba ou poemas bomba. Em tempo de Internet, podemos falar o que quisermos, só corremos o risco de não sermos ouvidos ou levados à sério.

Minha maior crítica às autoridades políticas é sua total insensibilidade em face à arte. Dilma, Serra, e seja lá quem for, nunca derramará uma lágrima ao ser atingido por um poema. No mundo tecnocrático em que vivemos, nosso passado glorioso ou odioso, não faz a menor diferença, todos somos iguais diante da mesmice, da ignorância, do cinismo, do vazio ideológico. Vazio ideológico não pelo esgotamento, mas pela incapacidade da compaixão. Vemos o outro como um obstáculo, e não um semelhante.
Diante disso todas as certezas se dissolvem.

Na luta pela sobrevivência à qualquer preço, a maior vítima é o belo. Sorte a poesia não se poder atribuir qualquer valor pecuniário.

segunda-feira, 13 de abril de 2009

A Cultura no Grande ABC.


Muito relevante as reportagens da semana passada veiculadas no Jornal Diário do Grande ABC a respeito das promessas de campanha na área da Cultura, o jornal está de parabéns pela iniciativa, que continue a cobrança. O primeiro sintoma perceptível nas reportagens é que quem fez os programas de governo não estava interado do que é e como funciona a Cultura de cada cidade. Percebe-se uma ausência total de discussões com os produtores culturais, que em muitos casos tem propostas de trabalho, que nunca serão ouvidas. É nítido que não se espera e ou não se quer a participação dos artistas da cidade no processo de produção e da educação não formal. Não é estranho ouvir quando se procura os setores de Cultura de qualquer de uma de nossas sete cidades, “é que eu não sou da cidade e não sei ainda o que esta acontecendo”, é claro que serão precisos quatro anos para que esta pessoa se ache. Teixeira Coelho nos afirma que sem a participação da sociedade civil não há Cultura.

Em nenhum momento fala-se de criação de um cadastro de produtores, de orientação à profissionalização dos mesmos, da intermediação em leis de incentivo à Cultura, é mais fácil chorar a falta de dinheiro, do que buscar onde ele está. Os partidos tem relações com deputados federais e estaduais, podemos conversar com eles fora da época da eleição (ou deveríamos). A Cultura é realizada por iluminados que muitas vezes só enxergam o seguimento do qual são oriundos, isto quando tem alguma relação com a Cultura. Infelizmente é comum cargos no setores de Cultura das cidade serem prêmios de consolação, barganhas políticas ou ainda castigo para pessoas que não são bem vindas em setores mais “importantes”. A estes “indesejáveis” muitas vezes, são atribuídas funções que nas mãos certas, seriam de grande valia para a cultura das Cidades.

Por último percebemos claramente que Cultura não tem a menor importância para nossos alcaides, tirando a retórica do discurso. A cultura não tem grande valor na barganha política, não traz votos expressivos, e é visto pelos setores de finanças como um dinheiro jogado fora. O que percebemos em tempo de “crise”, é uma tentativa, na socialização da miséria, que se concretizará, quando o Secretário de Mauá, pessoa que tenho muita estima, mas que se equivoca, ao falar de usar o dinheiro do FAC, que mal dá para o troco, e que deveria ir todo para os artistas, deveria ser usado na manutenção de próprios públicos. A cidade de Mauá é uma das poucas a ter uma lei de fomento, que embora seja pouco, pelo menos vai para os artistas. Corre se o risco do cobertor que não cobre nem os pés, ser tirado de nós.

Vídeo - Escritor Sacolinha no Programa do Jô Soares

Assista a entrevista que o Sacolinha concedeu ao Programa do Jô, clicando nos links abaixo.
Não é vírus. Caso tenha alguma dúvida, vá até o site do youtube e digite: Sacolinha no Jô.

Parte 1
http://www.youtube.com/watch?v=qZhNkT2nJNw

Parte 2
http://www.youtube.com/watch?v=iT3z93Jkk1c

sexta-feira, 10 de abril de 2009

Escrever é meu maior vício.


Um dia me fizeram uma pergunta que se tornou imperiosa em minha vida. -Você consegue parar de escrever? E descobri que não. Tentei por diversas vezes, mas descobri que era mais fácil parar de respirar. Escrever é meu maior vício. Drummond dizia que a poesia era a sua cachaça. Descobri também que era a minha. Mas escrever por escrever, vai ficando muito sacal, os papéis vão se acumulando, você organiza por data de escritura, faz pastas e mais pastas, isto se avoluma de tal maneira que é necessário se fazer alguma coisa com aquilo. Primeiro pensei em tocar fogo, fazer uma auto inquisição. Danei a reler todo aquele material, apurar algumas coisas, reescrever outras, outras abandonar por completo. Foi assim que nasceu meu primeiro livro, uma antologia de mim mesmo, um apanhado de vários anos de poesia sem rumo e sem direção.

Como tinha algum dinheiro na época e experiência nenhuma nesta área, fiz um livro auto-financiado, um livro de autor que recebeu alguns elogios, apesar de alguns defeitos técnicos, é meu de capa a capa, tudo foi feito por mim, organização, correção, diagramação, desenho da capa, só não fiz a impressão. Apareceu uma oportunidade em mil, um camarada do Ceará me fez cada exemplar por R$ 0,88 (Oitenta e oito centavos), com frete e tudo. Recorri a um velho amigo para fazer o prefácio, e lá estava ele. Sob o título pomposo de “Poemas Do Século Passado – 1982-2000”, nascia minha primeira aventura solo.


De repente tinha mil exemplares de um livro, na verdade mil e duzentos, pois o impressor me deu um brinde, e não fazia a idéia do que fazer com aquilo. Na falta de uma idéia melhor, fui dando aos amigos de presente, vendia alguns aos que queriam ajudar de alguma forma, os levava a encontros com escritores e acabava usando o livro como cartão de visita, mandei para revistas literárias, a críticos, jornais, gastei uma nota com correio. Algumas pessoas foram muito generosas, e embora eu suspeite de alguns porque são também meus amigos, recebi alguns elogios, o jornalista e poeta Zanoto volta e meia publica os poemas deste livro em sua coluna de jornal, já me usou até como epígrafe de seus textos.


A crítica mais interessante veio do poeta e ensaísta Ricardo Alfaya, que não poupou elogios a minha capa, um trabalho em arte xerox, usando uma série de documentos velhos. Uma boa medida para saber se estamos velhos é só conferir quantos documentos acumulamos. Pois bem o Ricardo Alfaya, desvendou o livro pela capa, um rito de passagem para a vida adulta, nos meus trinta e oito anos, finalmente havia chegado à maturidade, e afastado os fantasmas dos poemas guardados com o livrinho de poemas.

(Mas ai, encontrei pela vida o poeta Cláudio Willer, que me envenenou com o surrealismo, o que dá uma outra história.)


Enfim me restam uns muito poucos livros comigo, posso dizer que sou um autor de um título esgotado.

(De vez em quando ele aparece em um sebo ali e acolá, me deixando muito orgulhoso de meu filhote, que é como chama seus novos livros a poeta Dalila Teles Veras.)