Assisti esta semana, em DVD o filme “Não por Acaso” de 2007 (http://www.naoporacaso.com.br/), direção de Philippe Barcinski, cujo o título já é um poema concreto que pode ser lido de diversas maneiras. Mais do que qualquer coisa este filme fala desta solidão a que me refiro, aquela que não é de fora para dentro, não é a solidão por falta de companhia, mas a de não querer ter companhia. Aos personagens é necessário encarar a perda para enxergar além do mundo sob controle. Ao deixar de correr riscos, corremos o risco de não viver. A dor faz parte de nossas vivências, se não nos mata, fortalece. Nunca imaginei também ver em prédios cinzas e vias congestionadas uma aventura visual e poética.
Também assisti em DVD o filme de Wim Wenders “O céu de Lisboa” de 1994, como sempre estou bem atrasado, o filme já foi visto um monte de vezes por milhões de pessoas, todas as impressões já foram feitas e desfeitas, então qualquer crítica cinematográfica que pudesse fazer, já seria inócua. Alguns dirão que é um filme menor de Wenders, coisa muito comum, é sempre aparente se fazer inteligente, se desdenhar de alguma coisa, “Drummond não é um grande poeta, pois sua obra é irregular.” “Pastel de feira é comida de pobre” (quando todos sabemos que é uma iguaria sem igual, se comido em pé, equilibrando um copo de caldo de cana), entre outras observações pseudo-acadêmicas. Drummond é um gênio por sua irregularidade, o bom poeta não é o que escreve de forma uniforme, caso contrário seria um farsante que encontrou uma fórmula para fazer poesia em série como pastel, mas que não tem gosto de feira, nem foi experimentado pelo acaso. Em poucas palavras, algo bem feito, bem desenhado, mas sem alma.
Turístico é uma das críticas que se faz ao filme “O céu de Lisboa”. Só a participação do Madredeus já valeria o tempo usado. No entanto a poesia permeia o filme inteiro, desde uma pichação na parede, em que o garoto português encontra dificuldade para traduzir, (poema que depois descobri ser do poeta Jorge Humberto), até as citações de Pessoa, um Baudelaire lusitano, substituindo Paris por Lisboa em seu flanar. Mas o poema mais constante é a própria cidade, que Wenders consegue transmitir com maestria. Qualquer que seja a origem da idéia e roteiro do filme, o poético entrou pelas portas dos fundos e inundou a película. Somente quem enxerga as coisas pela superfície, não perceberá a poesia aqui e ali. Passando atrás das costas do ator, que nem se dá conta dela. A Lisboa do filme, tem grama crescendo no meio fio, lixo no ponto de ônibus, prédios medievais em ruínas que servem de cortiço. A cidade ainda não tinha sido contaminada pela mania de grandeza da Comunidade Européia, que afastou Portugal de si mesma, e do poético. A cidade que vemos acaba sendo tão verdadeira que podemos viver nela. É claro que provavelmente nunca conhecerei Lisboa, nem a turística nem a poética, sem dinheiro para viajar até dentro de meu país e com cara de árabe seria barrado no aeroporto de Barajas.
2 comentários:
Olá, Edson
Muito interessantes suas crônicas neste blog. Uma dica: nunca diga nunca. Lisboa é logo ali e... nunca é demais sonhar.
Só um reparo: o aeroporto de Barajas fica em Madri. O de Lisboa, agora simplesmentes denominado Aeroporto Internacional de Lisboa, já foi chamado de Portela de Sacavém. Certa feita, levei um tempão inutilmente a tentar fazer um gringo ao meu lado no avião pronunciar esse nome. Daí talvez o motivo de não mais utilizá-lo. Quanto ao filme e o atraso, também sofro dessa angústia, bobamente. Impossível estar "em dia" com tantas ofertas, ainda que de qualidade.
Parabéns e um abraço blogueiro
dalila teles veras
Alguns vôos para Portugal fazem escala em Madrid, onde ocorreram diversos incidentes com brasileiros.
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