segunda-feira, 26 de julho de 2010

4º CONCURSO LITERÁRIO DE SUZANO - Série Poemas Premiados

cabalísticos

mulheres que cheiram a incenso
não carregam cântaros de água
nos cabelos
não esperam os Ulisses que retornam
não tecem tapeçarias de Penélope
urdem crisálidas entre os dentes
como se sorrissem borboletas laranjas
dormem sob o céu de Mercúrio
e quando chove
dançam com serpentes cingidas à cintura


mulheres com orelhas pequenas
costuram a audição
em bordas de jarros de estanho
carregam nos pulsos sinais cabalísticos
estigmas de deuses ainda não nascidos
não enrolam o céu de estrelas
e não uivam para a lua

mulheres de pés azuis
não contam os dias
e não contam as horas
passam o tempo em buracos de minhoca
ao abrigo de buracos negros
não lavam os cabelos às sextas-feiras
não jogam amarelinha
que contêm inferno
coletam insetos miúdos em caixas de fósforos
e conhecem o outro lado da lua
mulheres da beira do mar
suturam redes com a seda retirada do baço
escamam peixes e os retalham
sem um reclamar sequer
não choram em enterros
e se vestem de azul por ocasião de luto
seus filhos respiram como se possuíssem guelras
e pés com nadadeiras
têm medo de altura,
mas não temem a água
costuram para seus homens fatos brancos
e se enfeitam com flores da mata
e quando a lua cheia cai em segundas-feiras
desprendem um suave cheiro de maresia

mulheres com olhos negros
conhecem a profundidade dos poços
se refletem em poças de água da chuva
sabem que o fogo vive
na alma negra do carvão
coletam libélulas para seu deleite
e as soltam vivas
rindo de suas revoadas
não costumam dizer mentiras
não falam muito à noite
nas luas novas buscam refúgio
na escuridão
quando amam
é normal se ouvirem trovões
à distância




4º CONCURSO LITERÁRIO DE SUZANO – Categoria Poesia – 1º lugar nacional - Associação Cultural Literatura no Brasil - Prefeitura de Suzano – Petrobras -2008;

Revista Trajetória Literária Número 04 - Pág 09

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