segunda-feira, 19 de julho de 2010

I Prêmio OFF FLIP de LITERATURA - Paraty - RJ - 2006 - Série Poemas Premiados

de um fragmento


1_

de um fragmento de osso produzir a agulha
para costurar as palavras no céu da boca
e com cuidado arrancar as estrelas
que insistem em ficar entre os dentes

desfiar o lóbulo da orelha
com estilhaços de vidro
e urdir uma escuta refinada com aço cirúrgico e ouro

2_

descobrir que a palavra desejo
não se agrega com pouco barro
e produzir o estrondo secular
das pernas traseiras dos grilos

colocar dois dedos na vagina
úmida e quente
e testar a temperatura das fogueiras
que queimaram o dom e o prazer do ser feminino

que ser homem é carregar a aspiração
de sempre retornar a úteros escuros
descer as mais profundas fendas e cavernas
e que morrer é se vestir de terra
para que uma mãe telúrica venha nos afagar os cabelos

3_

olha como choram os meninos apartados
como colam os dedos e arrancam a pele sem meditação
que arranham o couro do peito
feridos de tanto sal e sol

e retalham o horizonte com tesouras sensatas
e puxam fio a fio produzindo um novelo
recozendo o céu com agulhas de ossos humanos



I Prêmio OFF FLIP de LITERATURA - 1º lugar– Paraty – RJ – Gênero Poesia – Tema TERRA – Categoria Nacional - iniciativa da OFF FLIP - Circuito Paralelo de Idéias e conta com o apoio da Secretaria de Turismo e Cultura de Paraty - Paraty – RJ – 2006;



Páginas 98 e 99

2 comentários:

cantonholi disse...

bom demais...

escrevo em:

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www.micropoetricidade.blogspot.com

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saudações...

Carlos

Álvaro Andrade disse...

Muito bom, meu velho. Belo, muito belo:

"que ser homem é carregar a aspiração
de sempre retornar a úteros escuros
descer as mais profundas fendas e cavernas
e que morrer é se vestir de terra
para que uma mãe telúrica venha nos afagar os cabelos"